A Sociedade do tipo Limitada é o tipo societário mais utilizado no Brasil, sem sombra de dúvidas. Isto ocorre em decorrência dos seus benefícios característicos, dentre os quais se destaca, excetuadas algumas hipóteses, a limitação de responsabilidade do(s) sócio(s) ao valor das quotas de capital integralizado.
Sem esquecer que atualmente a sociedade limitada pode ser unipessoal (art. 1.052, §2º, do Código Civil), interessa à presente análise as sociedades chamadas pluripessoais, ou seja, com dois ou mais sócios em seu quadro societário.
Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados (art. 981 do Código Civil – CC).
Mas, afinal de contas, havendo pluralidade de sócios, quem fica responsável por definir os rumos do negócio? Qualquer um deles, agindo como bem entender? Definitivamente, não.
Dependem da deliberação dos sócios, além de outras matérias indicadas na lei ou no contrato: I – a aprovação das contas da administração; II – a designação dos administradores, quando feita em ato separado; III – a destituição dos administradores; IV – o modo de sua remuneração, quando não estabelecido no contrato; V – a modificação do contrato social; VI – a incorporação, a fusão e a dissolução da sociedade, ou a cessação do estado de liquidação; VII – a nomeação e destituição dos liquidantes e o julgamento das suas contas; VIII – o pedido de concordata (art. 1.071 do CC).
Tais matérias, de relevância extrema, possuem quóruns de aprovação diferentes, sendo que a “modificação do contrato social” e “a incorporação, a fusão e a dissolução da sociedade, ou a cessação do estado de liquidação”, previstas nos itens V e VI acima, atualmente devem ser decididas pelos votos correspondentes, no mínimo, a 3/4 (três quartos) do capital social (art. 1.076, inciso I, do CC). Trocando em miúdos, referidas questões são decididas pelo(s) sócio(s) que detenha(m) participação igual ou superior a 75% do capital social (em uma empresa com capital de R$ 100.000,00 com 100.000 quotas, seria(m) o(s) sócio detentor(es) de 75.000 quotas, por exemplo).
Trata-se do quórum mais elevado previsto no art. 1.076 do CC. As demais matérias previstas nesse artigo exigem maioria simples ou absoluta, a depender de cada caso (incisos II e III).
Outra matéria cuja deliberação é importantíssima guarda relação com a designação de administradores não sócios, que dependerá de aprovação da unanimidade dos sócios, enquanto o capital não estiver integralizado, e de 2/3 (dois terços), no mínimo, após a integralização (art. 1.061 do CC).
Entretanto, avizinha-se uma mudança expressiva: foi publicada hoje a Lei nº 14.451/2022, que reduz os principais quóruns de deliberação na Sociedade Limitada.
Pela nova redação do art. 1.061, a aprovação passa a ser de, no mínimo, 2/3 (dois terços) para a primeira hipótese (capital não integralizado), e de mais da metade do capital social para a segunda (após a integralização).
Já pela nova redação do art. 1.076, o inciso I foi revogado e os incisos V e VI do art. 1.071 passam a fazer parte do inciso II daquele dispositivo. Desta forma, em vez de ser exigido 3/4 (três quartos), passa-se a exigir apenas a maioria absoluta, ou seja, mais da metade do capital social para que ocorra a alteração do contrato social, ou para a aprovação de operações como fusão, cisão, dentre outras.
Referidos quóruns foram diminuídos certamente para desburocratizar e agilizar as operações, facilitando a tomada de decisão pela maioria absoluta; contudo, ainda há a possibilidade de os sócios avençarem entre si um quórum maior para deliberação de determinada matéria, por meio dos documentos societários, especialmente do Contrato Social – o que reclama uma análise e redação adequadas aos interesses dos envolvidos.
O quadro abaixo demonstra a forma de deliberação atual, e como vai ficar em breve:
HIPÓTESE | QUÓRUM ATUAL | NOVO QUÓRUM |
Modificação Contrato Social (1.071, V) | 3/4, ou 75%, do Capital Social (1.076, I) | Mais da metade do Capital Social (1.076, II) |
Incorporação, Fusão, Dissolução da Sociedade, ou Cessação Estado de Liquidação (1.071, VI) | 3/4, ou 75%, do Capital Social (1.076, I) | Mais da metade do Capital Social (1.076, II) |
Designação Administrador Não Sócio (1.061) | Unanimidade (capital não integralizado), ou 2/3 do capital social (após integralização) | 2/3 (capital não integralizado), ou mais da metade do Capital Social (após integralização) |
A Lei que alterou os quóruns só entrará em vigor após decorridos 30 (trinta) dias de sua publicação oficial.
Por isso, mais do que nunca, deve-se jogar luz nas relações entre os sócios, seus direitos e obrigações. Questões ligadas à administração; à apuração e ao pagamento dos haveres; às deliberações de determinadas matérias; são todas questões que podem e devem ser disciplinadas nos documentos adequados, sempre em respeito à legislação e em observância aos interesses dos envolvidos.
Até a próxima!
FÁBIO LUÍS PEREIRA DE SOUZA
Graduado em Direito pela Faculdade de Direito de Franca. Pós-graduado em Direito Processual Civil pela USP. Extensão universitária na Escola de Direito da Universidade do Minho, em Braga, Portugal. Certificado pela participação no curso “Planejamento Sucessório”, da FAAP e no curso “Holding Familiar – Aspectos Societário, Tributário e Planejamento Sucessório”, da SodepeBrasil – Desenvolvimento Profissional. Membro do Grupo de Estudos de Empresas Familiares – GEEF / GVlaw / FGV Direito SP. Atuou na Divisão de Contratos do Departamento Jurídico da PepsiCo do Brasil Ltda. Sócio fundador do TPC.